O ginásio do Colégio Santo Antônio, na 911 Sul, ganhou outro ritmo na manhã da última sexta-feira, 14 de novembro. Entre bancas organizadas por estudantes, visitantes circulando pelos estandes e vendedores mirins explicando seus produtos, a escola abriu as portas para mais uma edição da Feira do Programa Jovens Empreendedores Primeiros Passos (JEPP). A movimentação intensa refletia um projeto que, ali, já é cultura: o empreendedorismo é trabalhado na instituição há mais de uma década e, desde 2023, ganha forma com a feira anual.
Embora apenas as turmas do 6º, 7º e 8º anos participem diretamente do JEPP, a manhã foi de integração geral. Simultaneamente, a escola realizou a Mostra do Conhecimento, envolvendo estudantes do 1º ao 9º ano e também do Ensino Médio. A estratégia ampliou o fluxo de visitantes, impulsionando os negócios dos empreendedores mirins e valorizando o trabalho interdisciplinar desenvolvido ao longo do ano.

Segundo a coordenadora pedagógica do Ensino Fundamental II e Médio, Larissa Sousa, a semente da educação empreendedora no Colégio Santo Antônio foi plantada em 2014, quando a escola incluiu oficialmente a disciplina de empreendedorismo na matriz curricular do 6º ao 8º ano.
“Desde 2014, optamos por tornar as aulas de empreendedorismo obrigatórias para os alunos do 6º ao 8º ano do Ensino Fundamental. Todos os estudantes têm a disciplina inserida na grade curricular, todas as terças-feiras”, explicou.
Nos primeiros anos, contudo, o ensino era bastante teórico. “Trabalhávamos muitos conceitos, mas sentíamos falta da prática. Os alunos faziam cartazes, folders, mas não tinham um momento de apresentar algo concreto, que mostrasse na prática o que aprenderam”, destacou.
A mudança veio em 2022, quando a escola iniciou formações e encontros com o Sebrae no DF. A parceria se consolidou e, em 2023, o JEPP foi oficialmente implementado, permitindo que os estudantes aplicassem os conteúdos de forma vivencial.
“A feira veio para consolidar esse processo, permitindo que os alunos colocassem em prática tudo o que idealizaram ao longo do ano. É um tema extremamente relevante para a sociedade, e o nosso objetivo é fazer com que os alunos entendam o empreendedorismo como uma ferramenta de transformação desde cedo”, completou Larissa.
Parte fundamental desse percurso foi o trabalho da professora Débora Costa, que conduziu o JEPP até o início de novembro e ajudou a estruturar boa parte dos conteúdos que hoje dão suporte às turmas.
O cuidado com os animais como oportunidade de negócio
Entre os projetos desenvolvidos pelo 6º ano, esteve a Sustenpet, loja criada por um dos grupos para apresentar produtos sustentáveis voltados a animais domésticos. A aluna Júlia Ledes, de 11 anos, explicou que a ideia foi trabalhar soluções criativas, ecológicas e acessíveis.

Eles utilizaram camisas furadas para transformá-las em tiras que imitavam ossinhos para cães, criaram pompom de lã com palitos para que os gatos pudessem brincar e até confeccionaram uma cestinha de basquete para pássaros, feita de palitos e tampinhas.
Mas o que realmente chamou a atenção dos visitantes foram os petiscos artesanais produzidos pelo grupo. “Nós desenvolvemos cinco tipos de petiscos. Alguns assados e outros congelados”, contou Júlia. Uma das inovações foi o biscoito gelado de hortelã, pensado para melhorar o hálito dos cachorros. “Eu usei iogurte natural e folhas de hortelã, bati tudo e congelei. Desinformamos e agora pode ser vendido”, detalhou.
Outra novidade foi um petisco semelhante a uma “fini”, elaborado com gelatina, água de coco e beterraba. “É seguro para os animais, sim! A gente pesquisou tudo antes de fazer”, garantiu. Os alunos também criaram versões assadas, utilizando frango e outros ingredientes naturais. “Tem até o modo de preparo aqui. Se a pessoa quiser fazer em casa, pode!”, disse a estudante.
O processo de precificação foi um aprendizado à parte. “A gente avaliou os gastos, o tempo de produção e os materiais. Depois, fomos ajustando para não ficar nem muito caro, nem barato demais a ponto de não ter lucro”.
Segundo Júlia, o trabalho da professora Débora antes de viajar para Portugal foi fundamental para o preparo da turma. “Tivemos aula sobre tabela de preços, gráficos de renda, cardápio de degustação… Ela até trouxe pessoas do Sebrae para avaliar nossos produtos e dar dicas”.
Doce da Vaquinha: vivência rural vira negócio
Outro grupo do 6º ano trabalhou com a produção do “Doce da Vaquinha – a essência do doce, a consciência do amanhã”, um doce de leite artesanal feito diretamente na Fazenda Mineira, propriedade dos pais do aluno Davi Caputo, de 11 anos. Os colegas tiveram a oportunidade de realizar uma verdadeira imersão rural: acompanharam a ordenha, aprenderam sobre o manejo do gado e participaram de todas as etapas de produção.

A mãe do estudante, Raquel Caputo, zootecnista, acredita que experiências como essa têm um impacto profundo na vida dos estudantes. “Quando as crianças entendem de onde vem o alimento, o trabalho por trás dele e como isso pode se transformar em um negócio, elas enxergam o mundo com outros olhos. O empreendedorismo na escola faz com que criem gosto por produzir, vender e compreender o valor do esforço. Além disso, aprendem sobre controle financeiro e percebem que o trabalho tem um retorno. É uma formação que leva para a vida”, afirmou.
Davi, animado e caracterizado de vaquinha para atrair compradores, viveu a experiência com entusiasmo. “Eu gostei muito de ir para a fazenda com meus amigos. A gente viu a vaca sendo ordenhada e depois mexeu o doce até ele ficar pronto. É só leite e açúcar, bem natural. Eu achei legal vender porque as pessoas elogiavam o sabor. Foi muito divertido ajudar o grupo”, contou.
Space Games: inovação e leitura de mercado
Enquanto alguns grupos apostaram na alimentação, o 7º ano decidiu inovar ao criar o Space Games, um espaço dedicado a sessões de videogame. Os valores variavam entre R$ 6 e R$ 14, oferecendo de três a vinte minutos de jogos como Fifa 22, Fortnite e corridas de Fórmula 1.

O aluno Carlos Rafael explicou a escolha estratégica. “Na aula de empreendedorismo a maioria queria vender comida. Aí pensamos: se a gente fizer algo diferente, como videogame, vamos atrair mais gente e sem concorrência. E deu certo. Muita gente parou para jogar”.
Empreendedorismo que inspira vidas
Entre os jovens que já trilham caminhos mais longos dentro do empreendedorismo escolar está Linda Winck Prado, 15 anos, hoje aluna do 9º ano. Ela já participou do JEPP em outras edições e aproveitou a feira deste ano para lançar seu livro “Almas e Chamas”, obra que começou a escrever aos 13 anos.
Desde pequena, os pais incentivaram a leitura, e Linda sempre foi apaixonada por histórias de fantasia. Além da escrita, ela já empreendeu vendendo roupas de boneca feitas por ela mesma. Sua autonomia criativa também aparece na capa do livro — ilustrada pela própria autora.
Segundo ela, o JEPP foi decisivo em seu caminho. “O programa me ajudou muito a entender precificação, organização de entradas e saídas e como transformar uma ideia em algo real. Isso me deu coragem para publicar meu livro. Foi um sonho que ficou muito mais possível”, afirmou.
Um programa que forma cidadãos
A professora de geografia Wania Martins, que assumiu as turmas na reta final do programa, reforça que o JEPP vai além da venda. “Apesar de trabalharmos em sala temas como sustentabilidade e o que é o empreendedorismo, percebemos que os alunos se envolvem muito com a parte de alimentação. Cada criança traz uma vivência diferente, e é muito importante mostrar outras formas de empreender – principalmente com foco em sustentabilidade”, declarou.
Inspirada pela COP30 e por práticas inovadoras, ela quer aprofundar as abordagens nos próximos anos, incluindo preparações como farofa de casca de banana-da-terra, chips de batata-doce e até receitas com o umbigo da bananeira. “Quero que eles conheçam outras culturas e entendam que empreender também é transformar o que já existe”, concluiu.
Sobre o JEPP
A feira empreendedora realizada pelo Colégio Santo Antônio é fruto de um trabalho coletivo envolvendo professores e demais colaboradores da instituição. Para isso, o Sebrae no DF atuou de forma estratégica, capacitando os educadores para que se tornassem agentes multiplicadores, mediando conhecimentos e motivando os estudantes a aplicar na prática o que aprenderam em sala de aula.
Como resultado, eles puderam desenvolver habilidades empreendedoras, como a criação de marca, pesquisa de mercado, gestão financeira, fabricação de produtos para venda e técnicas de atendimento ao cliente.
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